Pular para o conteúdo principal

Doutrina sobre o Tema

“A “novidade” é a vedação legal expressa de mudança da residência permanente ou domicílio de filho menor para outra cidade, note-se cidade e não só país, por um dos genitores sem o consentimento do outro genitor, estabelecida no art. 1.634, inciso V do Código Civil (...) É coerente também com o instituto prevalecente da guarda compartilhada, inclusive em caso de litígio entre os genitores, conforme a mesma Lei 13.058/2014 (Código Civil, art. 1.584, § 2º), embora a vedação legal do art. 1.634, V se aplique a qualquer tipo de guarda, inclusive a unilateral.”[1]

Regina Beatriz Tavares, advogada, Presidente Nacional da Associação de Direito de Família e das Sucessões, e professora.



“Portanto, tornou-se atributo adicional do poder familiar o direito de os pais, coabitando ou não, dentre as várias faculdades arroladas, exercer o direito de conceder ou negar consentimento para os filhos mudarem sua residência permanente para outro Município (CC, art. 1.634, V). Sendo a guarda conjunta ou unilateral, nenhum dos genitores pode, doravante, trocar a residência dos filhos para outra cidade sem a expressa concordância do outro progenitor, cuja substituição de domicílio sem a consulta e anuência dos dois pais representaria um evidente abuso do direito ao livre e efetivo exercício conjunto e igualitário do poder familiar.[2]

Rolf Madaleno, advogado e professor.



“As duas atribuições acrescentadas pela Lei nº 13.058/14 ao art. 1.634 constam dos incisos IV e V: “consentimento para viagem ao exterior” e “consentimento para mudança da residência permanente para outro Município”. Mesmo que seja adotado o modelo da guarda unilateral que, como visto, passou a ser exceção, o pai/a mãe não guardião/não guardiã terá que ser consultado a respeito de possível viagem do filho ao exterior, bem como de possível intenção de mudança da residência permanente para outro Município.”

Neste particular, o Direito brasileiro passa a se filiar a orientação adotada em outros países que atribuem a ambos os pais - independentemente da sua condição de guardião ou não - as prerrogativas de participarem de deliberações muito importantes nas vidas de seus filhos, como a mudança de residência permanente, além de viagem para o exterior. O Brasil é signatário da Convenção da Haia sobre Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças, e uma das práticas Ilícitas previstas no referido ato normativo internacional é a transferência ilícita da criança de um país para outro sem o consentimento do outro pai/mãe.

Em vários países que são signatários da Convenção da Haia de 1980 há a previsão de violação ao direito de guarda quando um dos pais não é consultado a respeito da viagem e mudança de residência do filho para outro Estado contratante da Convenção. Doravante no Brasil, mesmo que haja guarda unilateral, o não guardião deverá ser consultado sobre a mudança de residência permanente da criança, bem como sobre qualquer intenção de viagem ao exterior.[3]

Guilherme Calmon Nogueira da Gama, desembargador federal e professor.



“No mesmo sentido é o disposto no inciso V do artigo (1.634), ao estabelecer que caberá a ambos os pais decidirem pela mudança ou não de residência permanente dos menores para outro município, não podendo se dar de forma unilateral por um dos genitores e sem qualquer justificativa, devendo o juiz analisar os argumentos da parte discordante para suprir ou não a falta de consentimento, lembrando que a Lei de Combate à Alienação Parental (Lei nº 12.318/2010) prevê a mudança de domicílio para local distante, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente, com familiares deste ou com avós, como uma das formas de alienação parental.”[4]

Do livro Código Civil Comentado: doutrina e jurisprudência, organizado pelo ex-ministro do STF Cezar Peluso.



"Essa nova redação trazida pela nova Lei, aos artigos 1.634, incisos II e IV, do Código Civil, é de grande valia. A necessidade de autorizações para os menores viajarem para fora do País, já era uma regra adotada nos Juizados da Infância e Juventude. Contudo, no tocante à mudança de residência do menor, o legislador era silente. Na maioria das vezes, o genitor detentor da guarda unilateral mudava de cidade sem qualquer comunicação ao pai ou mãe, criando uma intranquilidade. Não raro, sem saber o paradeiro do menor.

Essa providência, inquestionavelmente, atende ao princípio do melhor interesse do menor, evitando que o mesmo, de forma abrupta, tenha sua rotina interrompida e o convívio com o genitor afastado. Esse alcance do legislador possibilitará que o pai ou mãe não detentor da guarda seja consultado, ouvido sobre a mudança do menor, quando então poderá ser aquilatado se a mudança será positiva."[5]

Maria Luiza Póvoa Cruz, advogada e professora da Escola Superior da Magistratura do Estado de Goiás.



“Quando houver justificada razão para a mudança de domicílio, como uma proposta mais vantajosa de trabalho, a mudança não deveria ser submetida a hipótese do art. 1.634, V, do Código Civil, que confere aos pais o poder de conceder ou negar consentimento para que os filhos se mudem para outro município. A simples subsunção do fato à citada regra seria solução equivocada, pois acabaria por autorizar que um dos ex-cônjuges exerça verdadeiro controle sobre a vida do outro, permitindo ou não sua mudança de domicilio, sob o argumento de tratar-se apenas de autorização para a mudança do filho.

Por certo a liberdade positiva do genitor com quem o filho reside não pode ter seu exercício condicionado de tal modo que apenas possa realizar a almejada mudança se renunciar ao direito de ter sua casa como a residência principal da prole. A solução mais adequada, para estes casos, será submeter a questão a avaliação judicial para reavaliar o domicílio principal da criança ou do adolescente, agora confrontando se o município para o qual se pretende a mudança oferecerá melhores condições a prole do que o domicílio do outro genitor. Em caso positivo, autoriza-se a mudança. Em caso negativo, reverte-se a residência principal para a do outro genitor.”[6]


Waldyr Grisard Filho, professor, Sócio fundador do IBDFAM

_____________


[1] TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. Professora regina beatriz comenta a mudança de filho menor para outra cidade, em artigo e em vídeo. Disponível em: http://adfas.org.br/2020/02/18/professora-regina-beatriz-comenta-a-mudanca-de-filho-menor-para-outra-cidade-em-artigo-e-em-video/


[2] MADALENO, Rafael e MADALENO, Rolf. Guarda Compartilhada: física e jurídica. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2018. p. 306.


[3] DA GAMA, GUILHERME CALMON N. Guarda compartilhada: novo regime da guarda de criança e adolescente à luz das leis nº 11.698/2008 e 13.058/2014. In: Antônio Carlos Mathias Coltro e Mário Luiz Delgado (coords.). Guarda Compartilhada. Rio de Janeiro: Forense, 2018. p. 195-196.

[4] PELUSO, Cezar (Coord). Código Civil Comentado: doutrina e jurisprudência. 14º. ed. rev. atual. Barueri: Manoel, 2020, p. 1814/1815.


[5] CRUZ, Maria Luiza Póvoa. Visão em razão dos princípios fundamentais do direito. In: Antônio Carlos Mathias Coltro e Mário Luiz Delgado (coords.). Guarda Compartilhada. Rio de Janeiro: Forense, 2018. p. 221.


[6] GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda Compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2018. p. 217.

Comentários

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Manifesto da Campanha Filho Não é Mobília

Somos um grupo de mães, pais, filhos, avôs e avós, madrastas e padrastos . Somos profissionais de muitas áreas, mas somos, especialmente, juízes, advogados, psicólogos e assistentes sociais. Trazemos ao conhecimento de todos o manifesto que inaugura nossa campanha no mês de conscientização e combate à alienação parental. Neste ano de 2021 nosso tema será a mudança dos filhos para local distante desautorizada pelo outro genitor. Manifesto A mudança dos filhos para outro município, feita de modo súbito por um dos genitores, é um dos atos mais repudiados pela Lei de Combate à Alienação Parental. O tema é citado explicitamente em pelo menos três dos oito artigos. Não por acaso, sob o mesmo espírito, o Código Civil veda a mudança no inciso V do art. 1.634. Ainda assim, os operadores do Direito, especialmente o Judiciário, tendem a ignorar o ato e a lei que o repudia. Aliás, cumpre dizer que o já citado inciso do Código Civil segue sendo um ilustre desconhecido. Na doutrina familiarista pare

Camiseta Filho Não é Mobília

• 41 CAMISAS VENDIDAS • Camisa Filho não é mobília 100% algodão  Brinde: 1 caneca 400ml personalizada Acesse o link para adquirir: https://shopee.com.br/product/489875491/21432715385?smtt=0.489895069-1660082284.9 Valor: R$39,90 Tamanhos: M - altura 66 x 52 largura  G - altura 71 x 56 largura  GG - altura 74 x 56 largura Tamanhos sob encomenda: P - altura 62 x 50 largura G1 - altura 78 x 60 largura  G2 - altura 80 x 62 largura  G3 - altura 82 x 64 largura Forma de pagamento: • Pix • Boleto • Cartão de crédito (6x)

Mudança e Alienação na Guarda Compartilhada

Guarda compartilhada significa divisão equilibrada do tempo de convivência. Se a mudança dos filhos ocorre nessa modalidade de guarda o ato de alienação é ainda mais grave. Como escrevemos no nosso manifesto: A fixação da residência habitual do menor na guarda compartilhada tem servido para desigualar aquilo que deveria ser igual. É, nesse sentido, um verdadeiro retrocesso. Entende-se que exista, para usar um termo da psicologia, como objeto de transição para aqueles ainda atados ao modelo superado de guarda unilateral. Ou seja, a fixação da residência é mais uma necessidade emocional daqueles que operam o Direito que das famílias propriamente. Ocorre que ela tem feito inúmeras vítimas nos casos de mudança súbita.   Como explicar para um pai ou mãe que teve seu filho levado para longe que a figura quase retórica do detentor da residência habitual do menor se reveste de uma autoridade absoluta, verdadeira potestade, que se sobrepõe à guarda compartilhada e ao poder familiar igualitariam